quinta-feira, dezembro 04, 2008

Cautela na construção civil

Depois de um período de euforia de três anos, o setor da construção civil reduziu o ritmo da atividade e começa a cortar vagas, mostraram reportagens do Estado de sábado e de domingo. Mudou o estado de espírito dos empresários, diante do esfriamento da demanda, mas nem todos os dados apontam para uma fase de recessão no setor.

A construção civil foi o segmento econômico que mais empregou nos últimos anos. Abriu 303 mil vagas formais apenas entre janeiro e outubro deste ano. A alta de 19,8% na variação do emprego foi 160% maior do que a da indústria de transformação (7,61%) e 46% maior do que a do segundo setor que mais gerou vagas, a agropecuária, com 13,5%.

Com a exceção do Amapá, em todas as regiões pesquisadas no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho houve aumento do emprego na construção, em 2008. Mas, em outubro, houve mais demissões do que contratações no Acre, Amazonas, Tocantins, Ceará, Rio Grande do Norte, Bahia e em todo o Centro-Oeste, salvo Goiás. No Sul e Sudeste o saldo ainda foi positivo, com as exceções do Espírito Santo e do Rio Grande do Sul.

Em novembro, as primeiras indicações são de que haverá redução de vagas. Entre setembro e novembro, o Sintracon de São Paulo homologou 3.796 demissões, 30% acima da média do primeiro semestre. Haverá efeitos sobre a economia. "A construção civil é muito importante para o emprego", diz o economista José Pastore, consultor da Confederação Nacional da Indústria. "É um dos setores mais sensíveis à queda da confiança do consumidor." Sem confiança na manutenção do emprego, quem quer comprar imóvel adia o investimento.

Até agora, houve forte redução do número de lançamentos de imóveis na planta, pois, além da queda da demanda, a oferta de crédito diminuiu.

Um rápido processo de concentração está em curso, com a fusão de construtoras conhecidas, como a Company com a Brascan e a FIT com a Gafisa. As ações das construtoras caíram até 90% em Bolsa. A Abyara, uma das últimas a abrir o capital, busca sócios para se capitalizar, segundo a reportagem do Estado de sábado. Até a Cyrela, líder do setor, suspendeu projetos. "Foi uma freada brusca", diz o diretor do Secovi, Fábio Rossi.

Mas as construtoras têm em carteira muitos projetos em andamento, o que deverá assegurar um ritmo razoável de atividade no setor nos próximos dois anos. Para evitar problemas para os compradores finais, o governo anunciou que a Caixa Econômica Federal abrirá uma linha de crédito de R$ 3 bilhões para as construtoras.

Os financiamentos do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) recuaram, em outubro, em relação a setembro (de R$ 2,9 bilhões para R$ 2,4 bilhões), mas ainda houve crescimento de 20% em relação a outubro do ano passado. O que não será mais possível é a manutenção de um ritmo de expansão dos financiamentos com recursos da caderneta de poupança da ordem de 90% em relação ao ano anterior, como vinha ocorrendo desde 2006. As cadernetas, inclusive, sofreram, em outubro, saques superiores em R$ 412 milhões aos depósitos.

O crescimento do setor de construção dependerá mais de obras públicas e dos financiamentos à habitação popular. Deverá, portanto, ser crescente o papel da CEF, gestora dos recursos do FGTS, mas as construtoras terão de se voltar mais para a produção de unidades de baixo custo. A necessidade de construir para a população de baixa renda e para os estratos mais baixos da classe média significa, também, que o desenvolvimento do setor ocorrerá mais no interior do que nas capitais, onde os terrenos são mais caros.

No Brasil, onde não há problemas graves com empréstimos sem garantia para a compra da casa própria, nem circulam no mercado financeiro títulos imobiliários sem lastro, como nos Estados Unidos, o governo deve ser ágil para aumentar a oferta de crédito, evitando uma forte desaceleração num segmento vital para o nível de investimento e de emprego.